O CÉU PODE ESPERAR [1]
JE ( José Ervas) passeia no Céu quando avista ao longe o ZP (Zeca Pinhoada) e o chama.
JE: Meu bom amigo, ainda bem que te encontro por aqui durante o dia, ando há uns meses para falar contigo, mas às horas a que passeias já eu estou a dormir há horas.
ZP: De facto doutor, assim é, mas acabaram-se-me as cigarrilhas e tive de me levantar mais cedo e ir comprar tabaco, mas foi o destino que nos juntou porque também há bastante tempo que lhe queria dar uma palavrinha.
JE: Palavrinha? Por aquilo que tem vindo a acontecer lá em baixo em Piarça, teremos de ter é uma longuíssima conversa!
ZP: Como assim Doutor? Eu nada tenho a ver com o que se passa lá agora (exclamou amedrontado)!
JE: Muito bem, sentemo-nos por aí para falarmos, que a minha idade já não permite estar muito tempo de pé.
Tenho lido aqui em cima o Miradoiro e outros jornais locais e nacionais e estou a par do que se vai passando lá em baixo. Para além de ler ainda vou vendo alguma coisa, embora S. Pedro seja um bocado rígido, mas como S. Tomé também gosta de “ver para crer”, deixa-me dar umas espiadas de vez em quando.
ZP: Diga meu caro, fale que eu escuto-o com atenção e verei o que poderei fazer.
JE: Por minha infelicidade fiquei sem herdeiros e leguei em testamento todos os meus haveres ao Reino de Piarça, para que ali fosse construído um asilo para velhos e um lar para crianças desamparadas. Supus mal, que os rendimentos dos meus haveres, as dádivas dos mais ricos e outras ajudas dessem para manter o asilo e o lar. Durante anos vi dezenas de pessoas trabalharem desinteressadamente em prol desse meu sonho e vontade. Infelizmente por um lado e felizmente por outro, as coisas no mundo terreno mudam rapidamente. Tudo muda e nada fica estático, assim rezam os compêndios de História Universal, que eu bem conheço. Agora a casa onde morei está a ficar velha e a necessitar de obras urgentes, as minhas propriedades agrícolas pouco rendem ou quase nada. Tu acabaste por contribuir para que terceiros se aproveitassem à grande e à francesa da Fundição logo que o meu amigo Dr. Hermético Pachorra abandonou o cargo de Presidente da Fundição.
ZP: Doutor, desculpe, mas o seu testamento, pelo menos enquanto eu andei pela Terra foi sempre tido em conta.
JE: Zeca não ponho isso em causa, mas os meus herdeiros eram o Povo de Piarça e não apenas três pessoas que formam a Trilogia – Pai, Filho e Nora.
ZP: Dr. Ervas, receio que pouco possamos fazer e que nos próximos tempos as coisas mudem.
JE: Então e os velhos de Piarça, povo a quem nomeei meu herdeiro não pode usufruir do Asilo porquê? Porque toda a vida trabalharam e têm uma reforma miserável, ao contrário de outros que podem pagar mensalidades de hotel de duas estrelas? Eu sou republicano e entendo que se alguns de nós já nascemos em berços de ouro, devíamos contribuir para que os mais desfavorecidos pudessem gozar uma velhice com dignidade.
ZP: Doutor lembre-se que nós apenas somos almas. Se Deus e os santos pouco fazem por isso que podemos nós dois aqui em cima fazer, se nem com Deus conseguimos falar? Eu já tirei senha, mas estão alguns biliões de almas à nossa frente e apesar de Deus atender milhões por dia, ainda faltam uns meses para irmos à fala com Ele.
JE: Pá estás doente ou estás parvo? Achas que Deus não tem mais nada com que se preocupar? O que tiver de ser feito terei de ser eu e tu a fazê-lo e veremos se o Dr. Hermético Pachorra entra no nosso jogo, embora eu também tenha umas contas pendentes com ele.
ZP: Mas Doutor Ervas qual é a sua estratégia? Você está mesmo revoltado com o Reino.
JE: Espera, ainda mal comecei! Então mas quem és tu afinal para me roubares a minha Praça, para desprezares a minha Estátua e me deixares eternamente a mijar atrás do muro? Não achaste outro lugar digno para ter o teu nome, sem ser a Praceta José Ervas? Deves ter pedido ao teu amigo João Só Ares para disponibilizar ao seu amigo Trevo-do-Mar uns projectos de uns caixotes lá de Ulissipeia e como foste sempre solteirão arranjaste maneira de te deliciares com a bela vista de uma Boneca Nua lá por onde te passeias à noite, para baixo olhas à esquerda, para cima olhas à direita e durante o dia deves andar a babar-te lá à volta dela, agora até os pelos púbicos da boneca taparam com um papel, Zeca, não me digas que andas ciumento e tapaste as vergonhas à cachopa?
ZP: Doutor mas por quem me toma? Mas eu alguma vez concordei com aquela homenagem que me fizeram na Terra? Mas eu alguma vez pedi aquela Boneca Bacante, aquela Sarita dos Mamilos Espetados? Eu apenas me contentava com o nome de uma rua, como fizeram com outros democratas e anti-fascistas do Reino. Aquela Boneca era para ir para a Escola Superior de Bêbados, mas como bêbados os há e de Escola nada, era para ir publicitar o bar de alterne da Sra. Dª Rameira Kikas, ali para perto da Velha Praça, mas ela não caiu nas cantigas do Picasso do Reino, porque até as suas meninas andavam mais vestidas que aquela estatueta.
JE: Zeca e as catacumbas por baixo dessa tal Boneca Bacante? Aquilo é um parque de estacionamento ou uma floresta de pilares? Será para construir um Kartódromo Indoor? Ou El-Rei Trevo quer ter tudo preparado para se esconder da Guerra Atómica e fechar-se lá com os seus súbditos mais chegados?
ZP: Nunca entendi nem entenderei aquele El-Rei Trevo, o homem é de ideias muito à frente e cheira dinheiro a milhas.
JE: Mas eu tenho um Plano.
Zeca Pinhoada esfregando as mãos de contente, pede ansioso, conte doutor conte, que ando desertinho para ter umas aventuras, este tédio aqui no Céu mata-me.
JE: Como O CÉU PODE ESPERAR, porque El-Rei Trevo quando morrer vai para as Labaredas do Inferno, e nunca conseguiremos pedir-lhe explicações, teremos de ser nós a ir lá abaixo pedir-lhe responsabilidades.
ZP: Doutor isso é impossível, não somos almas penadas estamos aqui no Céu, só as almas penadas é que andam pela terra a infernizar a vida aos terrestres.
JE: Zeca descansa, está tudo controlado e pelo tempo que cá estamos já temos direito a precárias e vamos utilizar as precárias para irmos à Terra, vamos aparecer ao Triunvirato lá do Reino de Piarça e pedir-lhes responsabilidades, mas antes disso vamos espetar-lhes uns valentes cagaços e infernizar-lhes a vida…
JE: Meu bom amigo, ainda bem que te encontro por aqui durante o dia, ando há uns meses para falar contigo, mas às horas a que passeias já eu estou a dormir há horas.
ZP: De facto doutor, assim é, mas acabaram-se-me as cigarrilhas e tive de me levantar mais cedo e ir comprar tabaco, mas foi o destino que nos juntou porque também há bastante tempo que lhe queria dar uma palavrinha.
JE: Palavrinha? Por aquilo que tem vindo a acontecer lá em baixo em Piarça, teremos de ter é uma longuíssima conversa!
ZP: Como assim Doutor? Eu nada tenho a ver com o que se passa lá agora (exclamou amedrontado)!
JE: Muito bem, sentemo-nos por aí para falarmos, que a minha idade já não permite estar muito tempo de pé.
Tenho lido aqui em cima o Miradoiro e outros jornais locais e nacionais e estou a par do que se vai passando lá em baixo. Para além de ler ainda vou vendo alguma coisa, embora S. Pedro seja um bocado rígido, mas como S. Tomé também gosta de “ver para crer”, deixa-me dar umas espiadas de vez em quando.
ZP: Diga meu caro, fale que eu escuto-o com atenção e verei o que poderei fazer.
JE: Por minha infelicidade fiquei sem herdeiros e leguei em testamento todos os meus haveres ao Reino de Piarça, para que ali fosse construído um asilo para velhos e um lar para crianças desamparadas. Supus mal, que os rendimentos dos meus haveres, as dádivas dos mais ricos e outras ajudas dessem para manter o asilo e o lar. Durante anos vi dezenas de pessoas trabalharem desinteressadamente em prol desse meu sonho e vontade. Infelizmente por um lado e felizmente por outro, as coisas no mundo terreno mudam rapidamente. Tudo muda e nada fica estático, assim rezam os compêndios de História Universal, que eu bem conheço. Agora a casa onde morei está a ficar velha e a necessitar de obras urgentes, as minhas propriedades agrícolas pouco rendem ou quase nada. Tu acabaste por contribuir para que terceiros se aproveitassem à grande e à francesa da Fundição logo que o meu amigo Dr. Hermético Pachorra abandonou o cargo de Presidente da Fundição.
ZP: Doutor, desculpe, mas o seu testamento, pelo menos enquanto eu andei pela Terra foi sempre tido em conta.
JE: Zeca não ponho isso em causa, mas os meus herdeiros eram o Povo de Piarça e não apenas três pessoas que formam a Trilogia – Pai, Filho e Nora.
ZP: Dr. Ervas, receio que pouco possamos fazer e que nos próximos tempos as coisas mudem.
JE: Então e os velhos de Piarça, povo a quem nomeei meu herdeiro não pode usufruir do Asilo porquê? Porque toda a vida trabalharam e têm uma reforma miserável, ao contrário de outros que podem pagar mensalidades de hotel de duas estrelas? Eu sou republicano e entendo que se alguns de nós já nascemos em berços de ouro, devíamos contribuir para que os mais desfavorecidos pudessem gozar uma velhice com dignidade.
ZP: Doutor lembre-se que nós apenas somos almas. Se Deus e os santos pouco fazem por isso que podemos nós dois aqui em cima fazer, se nem com Deus conseguimos falar? Eu já tirei senha, mas estão alguns biliões de almas à nossa frente e apesar de Deus atender milhões por dia, ainda faltam uns meses para irmos à fala com Ele.
JE: Pá estás doente ou estás parvo? Achas que Deus não tem mais nada com que se preocupar? O que tiver de ser feito terei de ser eu e tu a fazê-lo e veremos se o Dr. Hermético Pachorra entra no nosso jogo, embora eu também tenha umas contas pendentes com ele.
ZP: Mas Doutor Ervas qual é a sua estratégia? Você está mesmo revoltado com o Reino.
JE: Espera, ainda mal comecei! Então mas quem és tu afinal para me roubares a minha Praça, para desprezares a minha Estátua e me deixares eternamente a mijar atrás do muro? Não achaste outro lugar digno para ter o teu nome, sem ser a Praceta José Ervas? Deves ter pedido ao teu amigo João Só Ares para disponibilizar ao seu amigo Trevo-do-Mar uns projectos de uns caixotes lá de Ulissipeia e como foste sempre solteirão arranjaste maneira de te deliciares com a bela vista de uma Boneca Nua lá por onde te passeias à noite, para baixo olhas à esquerda, para cima olhas à direita e durante o dia deves andar a babar-te lá à volta dela, agora até os pelos púbicos da boneca taparam com um papel, Zeca, não me digas que andas ciumento e tapaste as vergonhas à cachopa?
ZP: Doutor mas por quem me toma? Mas eu alguma vez concordei com aquela homenagem que me fizeram na Terra? Mas eu alguma vez pedi aquela Boneca Bacante, aquela Sarita dos Mamilos Espetados? Eu apenas me contentava com o nome de uma rua, como fizeram com outros democratas e anti-fascistas do Reino. Aquela Boneca era para ir para a Escola Superior de Bêbados, mas como bêbados os há e de Escola nada, era para ir publicitar o bar de alterne da Sra. Dª Rameira Kikas, ali para perto da Velha Praça, mas ela não caiu nas cantigas do Picasso do Reino, porque até as suas meninas andavam mais vestidas que aquela estatueta.
JE: Zeca e as catacumbas por baixo dessa tal Boneca Bacante? Aquilo é um parque de estacionamento ou uma floresta de pilares? Será para construir um Kartódromo Indoor? Ou El-Rei Trevo quer ter tudo preparado para se esconder da Guerra Atómica e fechar-se lá com os seus súbditos mais chegados?
ZP: Nunca entendi nem entenderei aquele El-Rei Trevo, o homem é de ideias muito à frente e cheira dinheiro a milhas.
JE: Mas eu tenho um Plano.
Zeca Pinhoada esfregando as mãos de contente, pede ansioso, conte doutor conte, que ando desertinho para ter umas aventuras, este tédio aqui no Céu mata-me.
JE: Como O CÉU PODE ESPERAR, porque El-Rei Trevo quando morrer vai para as Labaredas do Inferno, e nunca conseguiremos pedir-lhe explicações, teremos de ser nós a ir lá abaixo pedir-lhe responsabilidades.
ZP: Doutor isso é impossível, não somos almas penadas estamos aqui no Céu, só as almas penadas é que andam pela terra a infernizar a vida aos terrestres.
JE: Zeca descansa, está tudo controlado e pelo tempo que cá estamos já temos direito a precárias e vamos utilizar as precárias para irmos à Terra, vamos aparecer ao Triunvirato lá do Reino de Piarça e pedir-lhes responsabilidades, mas antes disso vamos espetar-lhes uns valentes cagaços e infernizar-lhes a vida…
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